FONTE: Rede Bom Dia
A Prefeitura finaliza um programa que, até o fim deste semestre, pretende oferecer alternativas profissionais a grupos de transexuais e travestis da capital, considerados os integrantes do mundo LGBT (Lésbicas, Gays, Transexuais e Travestis) que sofrem mais com a exclusão social e com o preconceito.
A ideia é similar ao que ocorre no programa De Braços Abertos, que paga um salário de cerca de R$ 400, além de garantir a moradia a dependentes químicos da Cracolândia para tentar combater o vício e fazer com que essas pessoas consigam reinserir-se na sociedade.
Batizada de TransCidadania, a iniciativa consiste em pagar um salário mínimo por mês para pessoas que fazem parte desses dois grupos e desejam ter uma melhor condição de vida. “Essa população é a que mais sofre violência e a que não costuma receber apoio de familiares”, explica Alessandro Melchior Rodrigues, coordenador de políticas para LGBT da Secretaria Municipal de Direitos Humanos, que está organizando o programa. “O que ocorre é que, assim que se assume, a travesti ou transexual acabam sendo expulsas de casa, interrompem seus estudos e recorrem à prostituição.”
De acordo com Rodrigues, o Brasil é responsável por 30% dos casos de violência em casos de homofobia no mundo, caso sejam desconsiderados os países que classificam o homossexualidade como crime.
O TransCidadania deve ter uma duração de dois anos para cada beneficiário, sendo que no primeiro ano quem ainda não completou estudos será inserido no EJA (Educação de Jovens e Adultos). No segundo ano, os participantes terão de fazer uma especialização profissional, como curso técnico. A ideia é que, enquanto façam parte do projeto, as transexuais e travestis tenham acompanhamento de saúde para que possam realizar o tratamento com hormônios adequado. Outro objetivo é evitar a utilização de silicone industrial. Quando as inscrições forem abertas, basta se inscrever no TransCidadania, é necessário ir ao Centro de Referência da Diversidade, na Rua Major Sertório, 292, Santa Cecília , ou ao Centro de Combate à Homofobia, no Pátio do Colégio, próximo à Sé.
‘Poder ser vista de outra maneira seria muito bom’
A travesti Jeany Dante, de 23 anos, faz ponto na Praça da República, na área central da cidade, há cerca de um ano. Antes disso, ela começou um curso de enfermagem, mas desistiu por não ter condições de pagá-lo. Apesar de ainda não ter ouvido sobre o TransCidadania, ela acredita que o projeto seja uma boa oportunidade para aquelas que desejam sair da vida da prostituição e da marginalização social. “Eu ainda lucro bem e por isso estou aqui, mas ter a oportunidade de ser vista pela sociedade de outra maneira, com outros olhos, é algo muito bom, algo que muitas de nós gostaríamos”, explica Jeany, que não se incomoda com os olhares tortos que recebe enquanto retoca sua maquiagem com a ajuda de um espelho que traz na pequena bolsa vermelha, da mesma cor do vestido curto e colado para chamar a atenção de eventuais clientes.
‘Nós merecemos ser tratadas como mulheres comuns’
Há 20 anos trabalhando com sexo, a travesti Michele Manuele, de 37 anos, conta que dificilmente conseguiria ganhar os R$ 200 por dia se não fizesse programas. Entretanto, ela acredita que a atitude de outras travestis, que fazem programas em troca de drogas ou tentam roubar seus clientes, vai tornar a vida de todas as concorrentes mais difícil. “Acho que, por causa dessa degradação, dentro de cinco anos todas nós vamos ter de arranjar outra atividade para fazer”, conta ela, que faz questão de caprichar na maquiagem do rosto e do corpo tatuado. Michele tem como planos entrar em um curso de veterinária, já que gosta muito de animais, inclusive os nove gatos que tem em casa. “Essa possibilidade de poder conseguir qualificação é bem importante para a gente”, afirma. “Merecemos ser tratadas por todos como mulheres comuns, com trabalhos comuns”, acrescenta Michele.
Serão injetados R$ 4,5 milhões para ajudar 500 delas até 2016
O TransCidadania terá verba das secretarias de Política para as Mulheres, Saúde e Assistência Social, mas ainda não está definido quanto cada pasta vai ter de investir. A Secretaria Municipal de Direitos Humanos deve injetar aproximadamente R$ 4,5 milhões no programa até 2016. Segundo Alessandro Melchior Rodrigues, coordenador de políticas para LGBT da pasta de Direitos Humanos, a ideia é que 60 travestis e transexuais sejam beneficiadas até o fim do ano e 500 delas façam parte do programa até o fim da gestão de Fernando Haddad.
A travesti Mirela Cândido faz ponto na Rua Aurora, no Centro. Ao saber da iniciativa, aprovou a medida da Prefeitura. “Este projeto é muito bem vindo porque nós, travestis, só temos duas opções profissionais: ou vamos ser cabeleireiras ou vamos fazer programa. Agora, essa é uma boa oportunidade de dar uma vida digna para a gente.”
Análise
Carlos Magno Silva Fonseca, presidente da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais
Medida pode ser referência
É uma medida muito positiva e inovadora. A expectativa é que ela dê certo e possa servir como referência no Brasil. Essa população tem um grau de vulnerabilidade muito grande e uma iniciativa como essa vai no sentido de diminuir esse quadro de risco. Muitas transexuais e travestis estão em estado de miséria e o estudo, além de um salário, pode proporcionar alternativas para que elas consigam sair desta situação. Esse programa tem o nosso total apoio, pois já está mais do que na hora de agir para prestar assistência a esses grupos.
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